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15 de setembro de 2010

Recado do cardeal Dirceu à rainha Dilma: tire o seu cavalo da chuva

Como dizia um contista mineiro: ” a situação vinha ruim, ruim e,de repente, piorou”.

Qual foi o contista que disse isso, eu não me lembro; mas tendo lido os jornais do dia, os leitores deste blog terão com certeza percebido o que me veio agora à cabeça.

Os sigilos fiscais quebrados? Os mistérios daquela casa mal-assombrada no quarto andar do Palácio do Planalto? Realmente, até aí a coisa vinha mal, muito mal. Em seguida o presidente da República falou em “extirpar” – nem mais, nem menos – um partido de oposição. Isso, para mim, é o que ele começou a fazer lá atrás, e vem fazendo, e não sei quando ele vai dar por concluído esse seu desatino. Por Bolívar Lamounier


Mas desse assunto eu tratei aqui ontem. Por razões que eu ainda não estou seguro de haver compreendido, Lula parece empenhado em demonstrar seu desapreço pelas leis. Não dá mostras de compreender ou de respeitar o papel e os símbolos da presidência da República.

O que me fez lembrar do tal contista foi um fato ocorrido na segunda-feira à noite, em Salvador. Uma fala – também muito comentada na imprensa de hoje – de José Dirceu a cerca de 100 sindicalistas petistas do setor de petróleo.

José Dirceu, para quem não se lembra, ocupou a chefia da Casa Civil no primeiro mandato de Lula. Teve seu mandato de deputado federal cassado e foi apontado pelo Procurador Geral como chefe da “organização criminosa” responsável pelo mensalão.

Para a questão que vou abordar em seguida, há um ponto ainda mais relevante: Dirceu é o homem forte do PT. Acima dele, só Lula. Daí me parecer apropriado imaginá-lo como um Richelieu ou um Mazarino, aqueles cardeais do período absolutista que só prestavam contas (quando prestavam) ao próprio rei.

Indagada outro dia sobre o papel que Dirceu terá em seu eventual governo, Dilma Rousseff evitou responder de forma clara - seja por não se sentir plenamente eleita, seja pela discrição que qualquer presidente deve manter na composição de sua equipe, seja enfim, como alguns jornalistas chegaram a especular, por não nutrir muito entusiasmo pela hipótese de tê-lo em seu ministério.

Pois então: em Salvador, na mencionada reunião de sindicalistas, Dirceu fez uma análise da conjuntura, mas aproveitou para mandar um recado a quem interessar pudesse. A Dilma – ele disse – “…não era uma liderança que tinha uma grande expressão popular, eleitoral, uma raiz histórica no país, como [a que] o Lula foi criando, como outros tiveram, o Brizola, o Arraes e tantos outros”.

Não é preciso ser malévolo para entender que essa frase de Dirceu teve um objetivo preciso: cortar pela metade a estatura política de Dilma. Uma tradução razoável seria: tudo bem que ela vai se eleger com não sei quantos milhões de votos, mas é tudo voto do Lula; se não fosse o mensalão, eu é que estaria no lugar dela e, além do mais, eu sou um petista histórico, um dirigente calejado; ela nem petista era. E completou, deixando claro que não está pensando “só” em disputar espaços com o PMDB: com Dilma, o que chega ao poder é o PT; mais especificamente, o projeto partidário petista de poder.

Dilma – é ainda Dirceu quem fala – “levará o acúmulo petista ao poder”. A construção não é castiça, mas pode ser compreendida como uma reiteração do que eu disse acima: o que está chegando ao poder são as forças que o PT acumulou nas suas três décadas de existência.

No poder, com o referido “acúmulo”, o PT vai fazer o quê ? “aprofundar as mudanças”. E como pretende fazer isso? Quais serão seus métodos? O ex-deputado estará também pensando em “extirpar” a oposição? Ou isso será matéria vencida nesse futuro que ele tratou de pintar para os sindicalistas?

No primeiro ano de governo de Dilma - disse Dirceu, com uma franqueza rara entre seus companheiros – o problema não será a oposição política, e sim a imprensa: “O problema do Brasil é o monopólio das grandes mídias, o excesso de liberdade e do direito de expressão e da imprensa”. Para bom entendedor, pingo é letra, mas o palestrante preferiu não deixar nenhuma dúvida: “Se queremos aprofundar as mudanças, temos que cuidar do partido e temos que cuidar dos movimentos sociais, da organização popular”. Ou seja, ele só evitou (a julgar pelo texto que apareceu hoje nos jornais) a expressão controle social da mídia.

Como informei aqui alguns dias atrás, alguns críticos acadêmicos quiseram me alvejar quando tomaram conhecimento de minha hipótese de “mexicanização”, ou de uma espécie de”chavismo branco” .O que eu esbocei foi uma tendência de médio prazo, e talvez não inteiramente conscientizada pelo estado-maior petista, mas cheguei a me sentir como um São Sebastião, crivado de flechas por todos os lados.

Hoje, ao ler os jornais, me senti até um pouco ingênuo. Com o “extirpar” perpetrado por Lula e essa franqueza sinistra de José Dirceu, todos os principais cronistas políticos sacaram o cartão amarelo e, se tivessem poderes para tanto, acho que sacariam também o vermelho.

Esta síntese é de Eliane Catanhede, na Folha. Com: “O PT, então, será o líder no Congresso de uma imensa tropa formada desde o PCdo B ao PP de Maluf, depois de já ter transformado a CUT, o MST e a UNE em agências do governo, financiadas com recursos públicos; já ter aparelhado o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, a Petrobras, o BNDES; e estar em vias de ‘extirpar’ a oposição, como disse Lula sobre o DEM, enquanto ataca pessoalmente os tucanos Tasso Jereissatti no Ceará e Arthur Virgílio no Amazonas.

Um dos laboratórios do ‘projeto político’ de Dirceu – prossegue Eliane Catanhede – foi a liderança do PT na Câmara antes da eleição de Lula, que atuava e respirava conforme Dirceu mandava. Era ali o foco dos dossiês, das CPIs, das denúncias de todo tipo contra Collor, contra Itamar, contra Fernando Henrique, contra tudo e contra todos os demais”.

Em comunicação pessoal, a também jornalista Janaína Leite levanta outras questões relevantes. Em que medida - ela pergunta - a ala sindicalista vai mandar num eventual governo petista?

“O fato de os sindicalistas estarem temporariamente prensados e atipicamente silenciosos não significa que irão ficar bem comportados. Os sindicalistas detêm capacidade de mobilização e infiltração, inclusive no funcionalismo público. Contam com poder de fogo financeiro considerável, mercê da participação que detêm em empresas e fundos de pensão estatais. E são a principal interface do partido com a mídia. Dirceu – lembra Janaína – não é o único a defender o “controle social” e o projeto de décadas de Estado petista. É apenas o que o faz de maneira mais explícita e ostensiva”.

Concluo este texto já bastante longo lembrando que essa antevéspera de autoritarismo em que o Brasil parece outra vez se encontrar deve-se também, em parte, a certa passividade e às dúzias de erros dos partidos de oposição durante todo o transcurso do governo Lula. Voltarei a este ponto nos próximos dias. Revista Exame


O PT DE DIRCEU QUE DILMA ESCONDE - Eliane Cantanhêde
A declaração de que o PT terá mais poder com Dilma do que com Lula, feita pelo ex-ministro José Dirceu, eterno presidente de fato do partido, é motivo para reflexões, avaliações e projeções muito sérias. Até porque - ou principalmente porque - o PT tem sido um ausente do discurso de Dilma na campanha.

A equação não fecha: Dilma disfarça o partido, mas o partido vai ter ainda mais poder no governo dela?

No debate Rede TV!/Folha, no domingo à noite, Dilma relegou mais uma vez o PT ao segundo plano, referindo-se ao "presidente Lula" e ao "nosso governo" como os seus verdadeiros partidos. Mas Dirceu entregou o jogo: o PT é que vai dar as cartas no governo Dilma - que, não custa lembrar, era do PDT até outro dia.

A julgar pelas pesquisas, o PT vem numericamente forte por aí. Vai fazer uma bancada grande e experiente no Senado (calcanhar-de-Aquiles de Lula) e tende a ultrapassar o PMDB como maior bancada na Câmara. (Aliás, desbancando a candidatura do peemedebista Henrique Eduardo Alves para a presidência da Casa.)

O PT, então, será o líder no Congresso de uma imensa tropa formada desde o PCdo B ao PP de Maluf, depois de já ter transformado a CUT, o MST e a UNE em agências do governo, financiadas com recursos públicos; já ter aparelhado o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, a Petrobras, o BNDES; e estar em vias de "extirpar" a oposição, como disse Lula sobre o DEM, enquanto ataca pessoalmente os tucanos Tasso Jereissatti no Ceará e Arthur Virgílio no Amazonas.

E aí entra a fala de Dirceu: "A eleição de Dilma é mais importante do que a do Lula, porque é a eleição do projeto político". Leia-se: Lula foi um meio para se chegar a um fim, ao tal "projeto político". Agora, falta explicar exatamento do que se trata, antes que o governo e o projeto se instalem. Dilma entregou um programa "hard" de manhã ao TSE e, de tarde, retirou e entregou outro "light". Até agora, não se sabe ao certo qual é para valer.

Um dos laboratórios do "projeto político" de Dirceu foi a liderança do PT na Câmara antes da eleição de Lula, que atuava e respirava conforme Dirceu mandava. Era ali o foco dos dossiês, das CPIs, das denúncias de todo tipo contra Collor, contra Itamar, contra Fernando Henrique, contra tudo e contra todos os demais.

E não é que foi dali que saíram Erenice Guerra, José Dias Toffoli, Márcio Silva? Saíram direto da central de dossiês contra adversários para o comando do país.

Erenice surgiu meio do nada e virou ministra da Casa Civil, principal cargo do governo. Toffoli é um ótimo sujeito, mas tinha todas as desvantagens e nenhum dos atributos para ser ministro, nada mais nada menos, do Supremo Tribunal Federal. E o tal do Márcio Silva é advogado da campanha de Dilma e dono de um escritório meteórico que, como diz o Painel da Folha de hoje (15/09/10), "é assunto de advogados há muito estabelecidos em Brasília".

Dilma teve a consideração de indicar a amiga e braço-direito Erenice Guerra como sua sucessora na Casa Civil. Mas, agora que a Casa Civil caiu (de novo) sob o peso da parentada toda dele, teve a desconsideração de rebaixá-la à condição de "mera assessora".

Deve estar aí a chave da questão: tem hora de esconder e tem hora de mostrar. É o PT das Erenices dos dossiês, do aparelhamento e do patrimonialismo que vai tocar o "projeto político" em curso no país?

E com o inestimável apoio do PMDB, evidentemente. Folha.com

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