Transformado em cabo eleitoral, o presidente da república festeja a alta carga tributária brasileira para sustentar um Estado. Lula encontra-se em uma encruzilhada real, em que o fantasma da inflação, as multas que vem recebendo por desrespeitar à Constituição que jurou cumprir e a desfiguração de seu perfil de protagonista internacional podem empanar o que de positivo fizera no seu primeiro mandato. Por Ives Gandra Martins
O certo é que o sucesso do primeiro governo em assegurar respeitabilidade no exterior, tendo obtido justa e merecida exposição, com reconhecimento internacional, desde o episódio de Honduras - em que foi armadilhado por Chávez e protagonizou melancólico papel-, principiou a se desfazer, e a imagem exitosa ainda é mantida no país à custa de uma fantástica propaganda oficial.
É de se lembrar que não reconheceu as eleições livres realizadas em Honduras, mas anda de braços dados com notórios ditadores, como Fidel Castro, Raúl Castro e Ahmadinejad, nada obstante pisotearem, esses senhores, os direitos humanos em seus países.
Em clara seletividade, aceita tais violações, por conta de sua amizade com ditadores ou seus aprendizes (Chávez e Morales), mas é cruel em relação aos governantes democraticamente eleitos em Honduras, pelo fato de seu presidente não ser acólito do histriônico e verborreico presidente venezuelano.
O pior, todavia, reside na instalação de uma República sindical no país, com legislação por ele aprovada, que possibilitou a transferência de polpudas somas dos contribuintes para as centrais sindicais, as quais se utilizam de dinheiro do povo para fazer, aberta e ilegalmente, a campanha de sua candidata.
Mais do que isso, o presidente da República, transformado em cabo eleitoral, festeja a alta carga tributária brasileira para sustentar um Estado hoje tomado por expressivo número de sindicalistas não concursados.
Compara-a, de forma canhestra, com a carga dos EUA, ignorando que lá a carga é bem menor que no Brasil, como o é no Japão, na China e em outros países que prestam serviços públicos dignos a seus cidadãos, ao invés de ser destinada, quase exclusivamente, a assegurar benesses aos detentores do poder.
Nunca votei em Lula, muito embora tenha reconhecido, desde o primeiro ano de seu governo, seu talento e habilidade, que permitiram a aceitação internacional e os elogios do presidente Obama.
O certo é que essa imagem começa a se desfigurar, nada obstante a manutenção de sua popularidade à custa de maciça propaganda. Quando a poeira da história se assentar e o historiador examinar o período de seu governo, sem as manipulações da propaganda oficial, certamente tais violações marcarão sua gestão e será contada a "verdade verdadeira" da era Lula.
Poder-se-á dizer que dirigiu bem a economia, o que é verdade, pois teve o bom senso de seguir rigorosamente a política de Fernando Henrique quanto a moeda e fundamentos, montando equipe de valor, que não se curvou aos apelos de gastança de todos os amigos do rei, malgrado o fantástico inchaço da máquina burocrática.
O certo, todavia, é que, mesmo na área econômica, o excesso de benesses aos servidores da máquina oficial (quase R$ 200 bilhões para pagar a mão de obra de menos de 1 milhão de brasileiros) projeta bomba de efeito retardado para o futuro governo, seja ele qual for.
É pena que Lula tenha se despido das vestes de estadista -que chegou a envergar, no primeiro mandato - para mostrar a face de exclusiva ambição pelo poder a qualquer preço, transformando-se em cabo eleitoral cuja especialidade maior é tisnar a lei e a verdade. TENDÊNCIAS/DEBATES da Folha de São Paulo
IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, 75, advogado, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, é presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio.
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